Neste artigo vou apresentar como uma crise na China pode atingir a nossa economia e por consequência os seus investimentos.
Para contextualizar, escrevo este artigo entre o dia 20 e 21 de setembro de 2021 enquanto as bolsas do mundo inteiro fecham no vermelho diante do colapso de uma incorporadora de imóveis chinesa chamada Evergrande que chegou a ser a mais valiosa do mundo alguns anos atrás. Atualmente a sua dívida superou US$ 300 bilhões a tornando uma das empresas mais endividadas do planeta. Entre julho de 2020 e hoje o preço de sua ação caiu mais de 90%.
A imagem abaixo representa 1 bilhão de dólares em notas de US$ 100.
A imagem abaixo representa US$ 318 bilhões em notas de US$ 100
Já faz anos que se fala sobre uma possível bolha imobiliária na China que ela estaria sendo desinflada pelo governo.
A “fórmula” para a criação de bolhas imobiliárias é conhecida por todos nós. O governo adota medidas para estimular a construção civil oferecendo crédito fácil e barato para qualquer um que queira construir ou comprar imóveis através de dívidas.
As empresas e as pessoas se endividam ao máximo para a compra de imóveis prontos. Os preços dos imóveis disparam e todos começam a comprar imóveis que ainda não existem (imóveis na planta) por preços cada vez maiores.
Quando o governo força a queda dos juros básicos da economia, na tentativa de estimular artificialmente o seu crescimento, as pessoas buscam os imóveis como uma forma de investimento. Elas investem fazendo dívidas para a compra de imóveis na planta de forma especulativa, na tentativa de obter lucro na revenda.
O setor de construção demanda uma enorme quantidade materiais, produtos acabados e serviços e isso estimula a economia.
Como você pode ver logo abaixo, a China demanda mais da metade de todo o cimento do mundo. Eles demandam praticamente a metade de todo alumínio, ferro, cobre, carvão e outras commodities produzidas por diversos países e que são importantes para a construção. O Brasil está entre os maiores produtores do mundo de muitas dessas commodities que aparecem na imagem abaixo.
Quando a China inunda o mercado local com “dinheiro novo” através de empréstimos, subsídios, incentivos, juros baixos, não só a economia chinesa é artificialmente estimulada como também todas as economias do globo.
O problema é que a prosperidade baseada no endividamento das famílias e das empresas dura pouco.
Infelizmente existem pessoas e governos que ainda não entenderam que riqueza se constrói acumulando capital e não acumulando dívidas. Quem acumula dívida desfruta de uma falsa prosperidade no presente as custas de um empobrecimento no futuro, já que em algum momento a dívida precisa ser paga com juros e correções. Esses juros e correções são pagos justamente para as pessoas que estão acumulando capital e não dívidas.
No caso das bolhas imobiliárias, em algum momento existem mais imóveis do que pessoas capazes de comprar esses imóveis, já que todas estão superendividadas. O mercado superaquecido inflaciona os imóveis e muitos fazem dívidas enormes. O desaquecimento do mercado junto com uma possível alta dos juros coloca o comprador em uma armadilha que é ter uma dívida que não para de crescer e um imóvel que não se valoriza como antes ou que perde valor.
No caso da empresa Evergrande, existem dívidas com bancos, fornecedores, investidores (debêntures) e pessoas que compraram imóveis e não receberam (imóveis vendidos na planta). Essa dívida supera o valor da empresa, dos imóveis que possui e todos os seus ativos. Estima-se que cerca de 1.500.000 de clientes poderiam perder o que já pagaram por seus imóveis que ainda não foram entregues (fonte).
O custo para a conclusão da obra se tornou maior que os ganhos que seriam obtidos com as vendas dos imóveis. A destruição foi a solução mais barata (fonte).
Provavelmente devido a sua origem camponesa, o povo chinês é conhecido por sua capacidade de poupar. A maioria das famílias poupa mais da metade da sua renda. Os que possuem uma renda maior chegam a poupar mais de dois terços da sua renda. O investimento preferido do chinês é o mercado imobiliário (compra de terras e imóveis). Grande parte do patrimônio da família chinesa está concentrada em imóveis. A porcentagem de famílias chinesas donas de pelo menos um imóvel próprio beira os 90% (fonte). Nos EUA esse número é de 65% (fonte), sendo que as famílias americanas são na média mais ricas que as famílias chinesas e poderiam ter mais imóveis.
O estouro de uma bolha imobiliária com a quebra de construtoras e a desvalorização generalizada dos imóveis pode resultar no empobrecimento de bilhões de famílias chinesas.
A crise também pode colocar em risco os bancos chineses e seus investidores, caso não recebam o dinheiro que emprestaram para a Evergrande e que certamente serviu de lastro para a emissão de investimentos de renda fixa para os pequenos e grandes investidores.
O setor imobiliário e de construção civil juntos respondem por 16% da economia chinesa, que é a segunda maior economia do mundo. Não existe setor imobiliário e de construção sem o forte envolvimento dos bancos que garantem os empréstimos para quem constrói e para quem compra imóveis. Por trás desses bancos existem pessoas que poupam e investem suas economias.
Uma crise generalizada na China pode impactar a economia brasileira de forma direta.
O gráfico acima nos mostra que grande parte de tudo que o Brasil exporta tem a China como destino. Isso significa que uma crise chinesa pode impactar de forma direta e indireta a nossa economia. Os preços de todas as commodities são pressionados para cima quando a China cresce e demanda mais insumos e alimentos e isso beneficia empresas brasileiras que lucram exportando esses produtos.
Esse grande volume de exportações cria uma relação entre a taxa de crescimento da economia chinesa e a taxa de crescimento da economia brasileira. Os investidores estrangeiros enxergam o Brasil como um dos países mais impactados por uma desaceleração da economia chinesa.
O gráfico mostra a taxa de crescimento do PIB chinês na linha azul e a linha pontilhada mostra a taxa de crescimento do PIB brasileiro. O PIB mede a taxa de crescimento das riquezas (produtos e serviços) produzidas no país.
Podemos ver que antes da crise de 2008 a economia chinesa crescia a taxas acima de 10% ao ano (linha azul e eixo lateral esquerdo) empurrando o crescimento brasileiro para níveis acima de 5% ao ano (linha pontilhada e eixo direito) em um período conhecido como “boom das commodities”.
O que muito se especula é a existência de um novo “boom de commodities”, que na verdade pode ser apenas o movimento natural de recuperação da crise de 2020 aliado a muita especulação. É necessário mais tempo para que possamos saber se realmente as commodities serão tão demandadas e terão preços tão elevados como agora. Um novo “boom das commodities” depende de um novo “boom” de crescimento da China nos próximos anos. O problema é saber o que o governo chinês fará para continuar estimulando a sua economia.
Na China existe a crença de que o governo deve intervir em todas as áreas da economia e da vida das pessoas para a construção de um país próspero e uma vida melhor para todos. É a ideia de que as pessoas são inaptas para tomar boas decisões sobre as suas vidas e por este motivo o governo e os seus técnicos devem tomar decisões por elas.
Podemos ver isso todos os dias. Recentemente o governo chinês proibiu o vídeo game das crianças (veja) e o lançamento de novos jogos (fonte). Eles proibiram o lucro no ensino privado (fonte). Proibiram a aplicação de provas pelas escolas (fonte). Proibiram reality shows na TV e estabeleceram “critérios de beleza” e o banimento de homens com aparência feminina na TV (fonte). As proibições, regulações e intromissões do governo nas pequenas questões familiares (para o bem de todos) também ocorrem nos pequenos detalhes envolvendo as empresas e todos os setores da economia.
Mesmo você acreditando que exista uma boa intenção em controlar a vida das pessoas, pois você acha que elas não sabem o que é melhor para elas, não podemos esquecer que as pessoas e a própria economia não funcionam como máquinas. Não é como apertar um botão e observar o resultado esperado acontecendo do outro lado.
A sociedade e a economia são sistemas muito complexos e a história nos mostra que uma decisão para se obter um determinado resultado muitas vezes nos leva a uma série de consequências não previstas e até indesejáveis. Por toda a parte a vida e a história nos mostra que cada evento produz uma infinidade de consequências como um efeito dominó ou o famoso “efeito borboleta”.
Agora mesmo a China vem construindo uma série de ilhas artificiais para uso militar no oceano, ignorando a zona econômica exclusiva dos países vizinhos. Filipinas, Vietnã, Japão, EUA e Austrália estreitam laços e iniciam uma espécie de corrida armamentista na região. Todos possuem suas razões e certamente todas elas são boas aos olhos das populações de cada país.
O Mar do Sul da China é uma antiga região de conflitos. Ele é a ligação entre o oceano Pacífico e Índico por onde circulam mais de US$ 3 trilhões em mercadorias por ano (um terço de todo o comércio mundial). Para complicar ainda mais, a região é rica em petróleo e alimento (peixes). A China acredita que é dona de toda a região vermelha no mapa acima, só que ninguém mais concorda com eles. Para entender a briga veja o vídeo.
O contexto para a revolta do rapaz era o seguinte: em 1908, a monarquia austro-húngara anexou a região da Bósnia e Herzegovina ao seu território por existir uma disputa dessa região com a Turquia. O objetivo foi mostrar para o mundo que o país ainda era uma grande potência na região. Até hoje existem países tentando provar que são grandes potencias regionais.
O assassinato foi o estopim para a primeira guerra mundial (20 milhões de mortos), segunda guerra mundial (72 milhões de mortos) e todos os outros conflitos que aconteceram por consequência de questões mal resolvidas nessas guerras.
Veja a imagem de um jornal brasileiro em 1904 noticiando o que seria o estopim das guerras. Nenhum leitor desse jornal poderia prever que o Brasil entraria na guerra em 1917, após navios brasileiros terem sido alvejados por submarinos alemães (fonte).
A história nos mostra que pequenos eventos isolados podem produzir consequências de proporções inimagináveis e totalmente fora do controle.
Sempre que a população exige dos seus governantes algum tipo de estímulo para aumentar a atividade econômica as consequências são desastrosas e vão do surgimento de bolhas, endividamento das famílias, empresas e do próprio governo até o início de grandes guerras.
As gerações seguintes reconstroem tudo, mas logo as próximas gerações esquecem o que aconteceu e os erros se repetem criando um novo ciclo de bolhas, crises e guerras.
Por este motivo é importante construir uma carteira de investimentos preparada para enfrentar instabilidades internas e externas e por isso vou continuar publicando novos artigos sobre a construção de carteiras tendo como base o meu novo livro sobre como simular e montar carteiras.
Um provérbio chinês muito antigo ensina algo fundamental para os investimentos: “Espere o melhor, prepare-se para o pior e aceite o que vier”.
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