Existem alguns fatores que definem o rendimento dos seus investimentos que podem ser controlados por você e outros que não podem.

Como mostrei nesse outro artigo aqui, não podemos controlar a rentabilidade ou a valorização que teremos ao fazer um investimento de renda variável (como o investimento em ações), mas podemos tomar decisões quais ações comprar e até quando realmente compensa manter essas ações. A questão do tempo é fundamental. É sobre isso que falaremos nesse artigo.

Comprar ativos de renda variável todos os meses, como se você estivesse aplicando dinheiro na poupança, sem observar que existem momentos mais favoráveis e menos favoráveis, pode reduzir a rentabilidade dos seus investimentos. Persistir em uma ação de uma empresa que apresenta deterioração dos seus resultados financeiros e consistente desvalorização de suas ações é um grave erro.

Muitos pequenos investidores que estão obtendo bons resultados nos investimentos de renda variável estão vivenciando a  chamada “sorte do principiante”.

A sorte costuma estar do lado dos novatos na renda variável por um motivo simples. Milhões deles são atraídos para esse tipo de investimento quando passamos por um ciclo muito específico na economia: juros baixos, inflação baixa, expectativas de retomada do crescimento e tendência de alta em quase todas as ações (até as ações de empresas com resultados ruins). O fluxo de entrada desses investidores, seja de forma direta (comprando ações) ou de forma indireta (investindo em fundos que investem em ações) acaba alimentando o crescimento dos preços.

Comecei a investir em ações no decorrer de um grande ciclo de alta da bolsa entre 2002 e 2008 e vivenciei as perdas provocadas pela correção que se iniciou em junho (-10,43%) e julho de 2008 (-8,48%). Ali era o início de um grande movimento de desvalorização de praticamente todas as ações de todas as empresas em todas as bolsas do mundo. Nos meses seguintes a nossa bolsa despencou -6,43%, -11,03, -24,80 até começar a se recuperar em janeiro de 2009. No total foram mais de 60% de quedas.

Aquele inverno de 2008 foi o fim da sorte de todos os principiantes que aprenderam a investir em ações entre 2002 e 2008.

Muitos desses jovens principiantes, que perderam boa parte do que ganharam, ficaram traumatizados com o ocorrido. Uma parte desses traumatizados passaram a “militar” contra a renda variável e não querem saber do assunto até os dias de hoje.

Outros resolveram estudar mais para dominar alguma estratégia específica de investimento em ações, pois ficou a impressão de que os resultados positivos do passado era apenas “sorte de principiante” ou consequência da tendência de alta que tornava rentável até as ações das piores empresas.

Alguns adotaram o “buy and hold” ou “comprar e segurar” as ações das melhores empresas. Outros escolheram a compra de ações com o objetivo de obter dividendos. Com a queda dos juros na renda fixa iniciada 2003, como mostra o gráfico (meta da Taxa Selic), mais pessoas buscaram ações com foco nos dividendos que elas pagam e mais recentemente existe uma busca por fundos imobiliários que oferecem alguma renda recorrente.

 

Atualmente temos uma geração inteira de pequenos investidores com idade entre 20 e 30 anos que não vivenciaram o ciclo de 2002/2008 e não tiveram a experiência de passar por uma forte correção, como a que ocorreu na segunda metade de 2008.

Só na próxima correção essa geração de investidores entenderá que o tempo de sair é tão importante quando o tempo de entrar e que precisamos aprender a ler as informações do mercado o quanto antes.

Como você pode ver no gráfico abaixo essas grandes correções são naturais, ou seja, sempre acontecem e deveriam fazer parte dos planos de todo investidor, mesmo aqueles que possuem foco no longo prazo. Tivemos grandes correções em 94/95, 97/98, 2008 e uma longa e lenta tendência de baixa entre 2010 e 2016.




Acima temos um gráfico mensal (cada candle verde ou vermelho representa a variação de 1 mês) do índice Bovespa entre 1994 e 2019. Esse índice mede o desempenho das ações mais negociadas da bolsa brasileira.

Podemos observar que é natural esperar que ocorram correções de pelo menos -60% depois de uma longa tendência de alta. Fácil saber que correções acontecem e difícil prever quando a próxima acontecerá. Por esse motivo, todo investidor precisa saber o que vai fazer quando as correções acontecerem.

Uma vez ouvi falar de uma frase dita por um grande investidor que falava algo parecido com isso: “Ganhe muito dinheiro quando as coisas estiverem bem, para que sobre muito dinheiro quando a crise chegar e levar grande parte do que você tem”.

Você já deve ter visto alguma entrevista de algum grande investidor (com bilhões na bolsa) que demonstra muita tranquilidade diante das crises e fortes perdas. O fato é que eles já ganharam muito dinheiro barato na bolsa quando a situação era favorável e não estão preocupados se uma parte disso for perdida (se não entende o que é dinheiro barato e caro leia aqui).

Muitos desses senhores bilionários possuem uma quantidade tão grande de ações que seria praticamente impossível vender todas elas sem derrubar seus preços. São como grandes navios sem qualquer mobilidade, mas com muito combustível para gastar enquanto enfrentam as tormentas. Você não tem um grande navio, provavelmente você tem um pequeno veleiro e não pode fazer o mesmo.

Na próxima grande correção, quem pratica o buy and forget (comprar e esquecer), buy and hold (comprar e segurar), buy and sell (comprar e vender) terá a oportunidade de testar suas convicções sobre a estratégia na próxima correção, pois todas vão exigir controle de risco e tempo.

São os investidores que “compram e esquecem”,  “compram e seguram” e os que possuem muitas ações com foco nos dividendos, que costumam concentrar uma grande quantidade do patrimônio na renda variável. Considerar que grandes correções acontecem precisa fazer parte do seu plano, assim como faz parte dos planos dos grandes investidores que adoram as mesmas estratégia.

O importante é que você entenda o seu tamanho e não tenha cuidado ao querer copiar o comportamento dos grandes investidores diante das tormentas.

Vou apresentar um exemplo de algo que costumo fazer e que mistura análise técnica e fundamentalista.



No gráfico acima temos o índice Bovespa e uma média móvel exponencial de 100 períodos em um gráfico semanal desenhado na ferramenta que uso para fazer análise técnica dos gráficos de preços. Você pode abrir uma conta gratuita para fazer suas leituras e estudos gráficos com foco em prazos longos.

Observe que se alguém tivesse adotado, como controle de risco, ficar fora da renda variável quando o índice Bovespa tivesse atingido a média móvel de 100 períodos, as perdas teriam sido limitadas em menos de 20%, pois muitas vezes essa é uma queda suficiente para atingir médias importantes com a média móvel de 100 períodos no gráfico semanal (que representa o preço médio da ação nas últimas 100 semanas no gráfico semanal).

É possível observar claramente que a média de 100 períodos costuma ser um ponto crítico no gráfico semanal para o índice Bovespa e para muitas ações. Quando ela é rompida para abaixo, normalmente ocorre o início de uma espécie de “catástrofe” nos preços das ações. Quando ela é rompida para cima e a empresa possui bons fundamentos, é comum observar o início de uma grande tendência de alta. Sempre que o índice cruzou esses patamares para baixo ocorreram outros 40% ou 50% de queda. Sempre tivemos alguma recuperação do mercado logo depois onde era importante ter algum dinheiro no bolso para aproveitar os preços em níveis historicamente baixos.

Aqui vale um destaque importante. Grandes investidores que possuem milhões ou bilhões em ações costumam aproveitar esses momentos em que o mercado despenca forte para comprar ações de boas empresas. Muitas vezes deixam de comprar mais ações enquanto o ciclo de alta dos preços continua forte, por entender que as grandes correções acontecem e eles precisam de dinheiro para aproveitar as oportunidades.

O problema é que você não é um grande investidor. Será mesmo que faz sentido assistir ao seu patrimônio investido em ações ser destruído em 50% ou 60%?

As perdas podem ser controladas, basta manter sua leitura sobre a situação do mercado. Quando ocorrer o processo de recuperação dos preços você terá dinheiro para comprar boas ações por bons preços.

É claro que diante da necessidade de venda você deve olhar para os custos (que é outro fator que você pode controlar). Ao vender ações você é isento de imposto de renda sobre o ganho de capital (diferença entre o que pagou e recebeu ao comprar e vender) se no decorrer do mês realizar até R$ 20.000,00 em vendas dessas ações. Se passar disso existe o custo de 15% de imposto de renda sobre o ganho de capital. Isso significa que você terá de escolher entre o custo de esperar a correção terminar e o custo de colocar o dinheiro no bolso (impostos) para recomprar suas ações quando as condições melhorarem.

Perceba que não estou me referindo a pequenas variações nos preços que são naturais e que não mudam a tendência primária de alta das ações. Estou me referindo a grandes movimentos que mudam a tendência de alta de uma ação para uma longa tendência de baixa e que deve ser observada em gráficos semanais ou mensais com médias muito longas (100 ou 200 períodos).

Quando olhamos os gráficos semanais das principais ações, logo percebemos que não costuma ser uma boa ideia manter investimentos em ações de empresas que possuem preços abaixo da média de 200 (veja o gráfico abaixo). A média móvel de 100, tocada ou cruzada no decorrer de um ciclo de alta, também não costuma ser um bom sinal.

O toque do preço nas médias mais importantes muitas vezes sinaliza algum problema nos fundamentos da empresa que você ainda não percebeu. Investidores institucionais (bancos, fundos, gestores de fortuna, etc.) olham os resultados das empresas com lupa, analisam dados econômicos diariamente e alguns, as vezes, até acessam informações privilegiadas (exemplo 1, exemplo 2). Os movimentos desses grandes investidores movimentam preços e alteram tendências.

Vamos ver o exemplo de uma ação que teve sua forte tendência de alta atingida por uma deterioração nos seus resultados financeiros.

No gráfico acima temos a ação de uma empresa que sempre foi muito querida por todos que “compram e esquecem”, “compram e seguram”, “compram para dividendos” e “compram e vendem”.

Não vou citar o código da ação, pois existem pessoas que cultivam vínculos emocionais com suas ações e ficam magoadas com quem fala de seus afetos. Meu objetivo aqui é educativo e nunca de indicar ou desindicar um investimento.

Qualquer um desses investidores listados, que adotasse como critério de segurança não investir em ações que operam com preços abaixo da média de preços de 100 períodos (no gráfico semanal) ou de 200 períodos, teria evitado uma enorme perda no exemplo da ação acima.

Veja que no todo direito do gráfico tivemos uma queda de -62,11% no preço da ação no decorrer de 574 dias (iniciando em janeiro de 2018). O pequeno investidor poderia ter abandonado o investimento com perda de -13% ou -22% nos meses de março ou abril quando o preço rompeu para baixo a média de 100 e 200 períodos no gráfico semanal (que são dois sinais muito negativos). Uma perda de -13% ou -22% logo nos primeiros meses seria bem melhor do que assistir -62,11% de perdas, além do custo de oportunidade de manter seu dinheiro em um ativo que se desvaloriza enquanto outras empresas na bolsa passam por uma ótima tendência de alta, parecida com o que essa empresa acima passou entre 2009 e 2014.

Observe no gráfico acima que o preço da ação tocou a média de 100 períodos (linha vermelha) no final de 2014 e voltou a fazer a mesma coisa em 2016 após fortes quedas (que chegaram a 20%). Isso só tinha ocorrido na crise de 2008, como você pode ver no canto inferior esquerdo do gráfico. Para o investidor que observa os preços no longo prazo atentamente, através da análise técnica, isso já seria um sinal negativo que poderia ser confirmado através da análise fundamentalista. Vamos observar um gráfico fundamentalista:

Na figura acima temos um dos gráficos da ação para análise do histórico dos fundamentos. Cada barra laranja representa a variação de resultados operacionais em bilhões entre o trimestre do ano e o trimestre do ano anterior.

É possível observar logo acima que em 2014 ocorreu o fim da tendência de alta do resultado operacional da empresa (o resultado parou de subir sequencialmente como vinha ocorrendo desde 2012). Isso resultou em impacto imediato nos preços que deixaram de subir com a mesma força até tocarem na média de 100 períodos (veja no gráfico anterior).

Tivemos uma retomada no crescimento do resultado no gráfico acima até 2016 e os preços voltaram a subir no gráfico anterior.

No quarto trimestre de 2016 tivemos queda no resultado e podemos ver uma forte queda no preço da ação em 2016 fazendo esse preço tocar na média de 100 novamente.

Mesmo com resultados operacionais e lucro líquido em queda desde 2016, as pessoas que compram e esquecem, compram e seguram e compram para receber dividendos continuaram acumulando as ações,  fazendo o preço subir. A ação se recuperou da queda de 2016 até despencarem de vez em 2018. O gatilho para a forte queda certamente foi a redução do pagamento de dividendos.

Quem acompanha os dados fundamentalistas começou a perder o interesse por essa ação em 2016 ao perceber nos gráficos a deterioração de diversos indicadores.

Quem acompanha o preço da ação e utiliza algum controle de risco, como não investir em ações com preços abaixo da média de 100 ou de 200, conseguiu evitar a totalidade da perda que estava por vir (mais de 60%).

Quem prefere investir em ações de boas empresas que estão em forte tendência de alta, provavelmente teria percebido o enfraquecimento da tendência ainda em 2014. A média de 100 períodos que se movimentava em um ângulo de 41° passou a se mover em ângulo de 16° depois do primeiro toque na média móvel de 100 em 2014. Observe o gráfico:

 

Se você compra ações de boas empresas e adota a estratégia do comprar e esquecer, comprar e segurar ou comprar para receber dividendos por acreditar que essa é a melhor forma de fugir da necessidade de monitorar os fundamentos da empresa e os preços das suas ações, saiba que você está deixando de fazer o seu controle de risco.

O controle pode ser feito uma vez por mês ou uma vez por semana em poucos minutos de observação, caso você já tenha o domínio das ferramentas e sua leitura.

É claro que se você não domina as ferramentas e a leitura das informações, tudo fica complicado, difícil e demorado. É como pedir para alguém ler as manchetes dos jornais somente uma vez por semana ou uma vez por mês. Se a pessoa não souber ler, sempre será muito difícil ou até impossível acompanhar o que acontece por meio da leitura.

Precisamos aprender a “ler” o que está acontecendo com os nossos próprios investimentos, principalmente os de maior risco como os de renda variável.

Infelizmente a maioria das pessoas não sabem “ler” o que acontece no mercado. Essa deficiência acontece na renda fixa e se manifesta de forma ainda pior na renda variável.

Vejo muitos pequenos investidores se amontoando em transmissões ao vivo e em áreas de comentários do Youtube, nas redes sociais e fóruns pedindo as opiniões ou a leitura que os outros estão fazendo sobre o mercado de ações e fundos imobiliários.

São pessoas que ainda não aprenderam a ler buscando alguém que faça a leitura por elas.

Isso sempre me faz lembrar aquela mulher que ganhava dinheiro lendo e escrevendo cartas para os analfabetos no filme Central do Brasil. Nem sempre ela entregava as cartas que escrevia, nem sempre ela lia da forma que deveria ler, nem sempre ela tomava a decisão correta diante dos seus pobres clientes. Clique para assistir ao vídeo e relembrar:


Você precisa evitar ser um Josué (menino do filme) no mundo dos investimentos. A internet está cheia de “Doras” oferecendo leitura do mercado e muitas vezes essas pessoas se comportam como a personagem Dora na fase inicial desse filme (que faz coisas terríveis com os clientes e Josué antes de se arrepender). Evite esse tipo de dependência no mundo dos investimentos.

Se você compra ações com base na leitura que os outros fazem (casas que vendem relatórios de recomendações, analistas de corretoras, gerente de banco, youtubers, amigo, parente, por achar que essas pessoas sabem mais do que você, tenha a certeza de que você está deixando de lado um trabalho que é de sua responsabilidade.

Isso vai elevar seus riscos quando as correções ocorrerem, sejam aquelas correções que atingem toda a economia e todas as empresas listadas na bolsa ou correções específicas de cada empresa, que normalmente refletem uma degradação dos seus fundamentos.

Tenha a certeza que nenhuma “Dora” vai pegar você pela mão, como a Dora do filme fez com Josué quando se arrependeu. Ela pode até dar a recomendação certa em um momento bem específico, mas depois o problema é seu. Ela não vai ligar para você, enviar carta ou e-mail avisando que um bom investimento deixou de ser um bom investimento. Você precisa fazer esse monitoramento e de preferência, sem ficar dependendo das Doras que estão por toda parte.

Eu defendo a ideia de que todas as estratégias de investimento são boas se você está preparado(a) para executar essa estratégia e entende se ela se adapta ao que você é, seu tempo, seus objetivos e recursos financeiros. Não importa se você faz day trade, swing trade, se compra e vende ações no longo prazo, compra e segura, compra e esquece para sempre ou qualquer outra modalidade existente.

Desconfie de quem gasta muita energia tentando convencer você de que a estratégia X é melhor que a Y. Se você fosse dono de uma corretora, você certamente motivaria o uso da estratégia X. Se você fosse uma Dora, que vende leitura para analfabetos, certamente recomendaria a estratégia Y. Se você fosse um grande investidor, com uma grande carteira de ações, certamente indicaria coisas como “compre sem olhar o preço”, “compre e nunca venda”, “compre as mesmas ações que eu tenho na minha carteira”, “pare de comprar e vender as ações que eu tenho” e assim por diante. A leitura que os outros fazem sobre o que você deve fazer com o seu dinheiro tem relação com o lucro deles e não com o seu lucro.

Nenhuma dessas estratégias pode tirar de você a responsabilidade de controlar riscos, controlar o tempo de entrada e saída, controlar seus custos e controlar o seu comportamento diante das mudanças que inevitavelmente ocorrem dentro das empresas, nos mercados onde elas atuam ou mesmo na economia.

A capacidade ler e entender o comportamento dos preços (análise técnica) e ler e entender o comportamento dos resultados das empresas (análise fundamentalista) é como a capacidade de ler e entender um texto. Você só precisa aprender uma única vez para aproveitar a ferramenta pelo resto da vida.

No próximo artigo vamos falar mais sobre controles e leituras.

 

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