Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul (BRICS) estão desenvolvendo uma moeda lastreada em ouro segundo a notícia da tv da russa “RT TV”, divulgada recentemente.
BRICS is set to introduce a new currency backed by gold, in contrast to the credit-backed US dollar, with the decision coming a month ahead of the bloc's summit in Johannesburg. With the growing initiative, more and more countries are lining-up to join the group. pic.twitter.com/U5ExGv4IE3
— RT (@RT_com) July 5, 2023
O texto da notícia diz assim: “O BRICS deve introduzir uma nova moeda lastreada em ouro, em contraste com o dólar americano lastreado em crédito (dívida), com a decisão chegando um mês antes da cúpula do bloco em Joanesburgo. Com a crescente iniciativa, mais e mais países estão se alinhando para se juntar ao grupo.”
Existe uma versão em português com a dublagem feita por uma inteligência artificial, veja aqui. Pelo que pude pesquisar, os países abertos a usar a moeda lastreada em ouro criada pelos BRICS são esses: Argélia, Argentina, Bahrein, Bangladesh, Belarus, Egito, Indonésia, Irã, Cazaquistão, México, Nicarágua, Nigéria, Paquistão, Arábia Saudita, Senegal, Sudão, Síria, Emirados Árabes, Tailândia, Tunísia, Turquia, Uruguai, Venezuela e Zimbábue. Grande parte desses países possui moedas fracas por culpa do tipo de político e ideologia que os governaram nas últimas décadas.
Vamos refletir sobre essa “possível ameaça” ao dólar americano.
O valor da moeda de um país é baseado em vários fatores, mas o fator mais importante é a confiança.
Você confia na moeda de um país se ela tiver lastro financeiro ou físico.
- Lastro físico: é quando a moeda é garantida por um ativo físico, como o ouro ou a prata. Nesse caso, a moeda tem um valor intrínseco, pois pode ser trocada pelo ativo que a respalda. Antigamente, as moedas eram lastreadas em ouro, mas esse sistema foi abandonado na década de 1970.
- Lastro financeiro (fiduciário): é quando a moeda é garantida pela confiança que as pessoas tem pelo governo de um país. Nesse caso, a moeda tem um valor extrínseco. Esse tipo de lastro depende da política monetária (juros), a política fiscal (arrecadação de impostos), a situação da dívida pública (títulos públicos), o crescimento econômico, a inflação, a balança comercial, as reservas internacionais e a credibilidade dos políticos que estão tomando decisões que interferem em todas essas variáveis.
O Brasil, assim como os EUA e quase todos os países possuem moedas fiduciárias que são lastreadas na capacidade do governo do país tomar riquezas da sociedade pela força (impostos) e na capacidade de fazer dívidas vendendo títulos públicos para essa mesma sociedade (que poupa) em troca de juros que no futuro serão pagos com mais impostos ou emissão de mais títulos.
Diante disso existe uma grande questão que devemos refletir: Os países do BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) possuem dados financeiros confiáveis que sirvam de lastro? Como a resposta para essa pergunta é: NÃO, esses países precisam de um lastro físico como o ouro caso queiram deixar de usar moedas fortes de outros países.
Mas agora temos outra pergunta: Quem vai confiar na história de que essa nova moeda será realmente lastreada em ouro? Precisos de confiança.
Para que você confie nas informações divulgadas pelos políticos de um país é necessário que exista alguns tipos de liberdade como: imprensa, individual e financeira dentro desses países.
Entender isso é bem lógico. Se o país persegue os veículos de imprensa que fazem oposição ao governo e se ele persegue as pessoas que falam qualquer coisa contra as narrativas econômicas que os políticos inventam, você certamente não terá informações confiáveis e assim será difícil acreditar na força de uma moeda, seja ela lastreada em dívida ou lastreada na história de que existe ouro por trás dela. Quando você não confia, você entende que qualquer regra dita hoje pode ser alterada no dia seguinte.
Então vamos investigar nos rankings públicos de liberdade de imprensa, liberdade individual e liberdade financeira para verificar a situação dos países que fazem parte do BRICS e que querem criar uma moeda de ouro que salvará o mundo e todos os países que possuem moedas que não valem nada:
- O Brasil ocupa a 111ª posição no Ranking Mundial da Liberdade de Imprensa, que é uma posição muito ruim. Com relação a liberdade individual o Brasil ocupa a 82ª posição no Índice de Liberdade Humana. Sobre liberdade financeira o país ocupa a 144ª posição no Índice de Liberdade Econômica. Todos esses números são considerados ruins.
- E como será a situação na Rússia? Sobre liberdade de imprensa a Rússia ocupa a 149ª posição (pior que o Brasil). Sobre a liberdade individual o país ocupa a 114ª posição. Sobre a liberdade financeira o país ocupa a 94ª posição. Todos esses números são ruins.
- Talvez na Índia, a situação seja melhor? Com relação a liberdade de imprensa o país ocupa a 142ª posição. Sobre a liberdade individual o país ocupa a 111ª. Sobre a liberdade financeira o país ocupa a 120ª posição.
- Com fica a situação da China? Sobre a liberdade de imprensa é a pior do BRICS até o momento, o país ocupa a 177ª posição (pior dessa lista). Sobre a liberdade individual o país ocupa a 129ª posição. Sobre a liberdade financeira o país ocupa a 103ª.
- Por fim a África do Sul, que é o mais pobre do BRICS. O país ocupa a 31ª posição no Ranking Mundial da Liberdade de Imprensa de 2020, que é uma boa posição. Sobre a liberdade individual o país ocupa a 63ª posição que é uma posição mediana. Sobre a liberdade financeira o país ocupa a 99ª posição.
Como é possível confiar em uma nova moeda que dizem ser lastreada em ouro quando os países envolvidos estão entre os piores com relação a liberdade que deveria existir para divulgar as informações sobre a política e a economia dos governos que fazem essa afirmação?
Logo abaixo temos um gráfico interessante que você pode criar visitando aqui. Ele mostra a nota (entre 0 e 100) da “Integridade dos Governos”. A média dos 5 governos que fazem parte do BRICS foi de 39,9. Todos estão classificados com nota muito baixa e por isso estão na zona vermelha.
Mas o que seria a “integridade do governo” com essa média tão baixa (39,9)? O guia do índice (fonte) apresenta uma explicação: quanto menor for a “integridade do governo” maior a presença de corrupção sistêmica, suborno, nepotismo, clientelismo, peculato e outros crimes que afetam a integridade do governo que controla o país. É possível confiar na moeda de um grupo de países nessa situação?
Logo abaixo temos outro gráfico importante dos BRICS sobre liberdade.
O gráfico acima fala sobre a liberdade financeira. A nota de entre 0 e 100 desse índice para os 5 países também é muito baixa (38). Quanto menor essa nota, pior é a situação de transparência e veracidade (integridade) sobre a economia e o mercado financeiro nesses países. Quanto menor a nota, pior é o sistema regulatório e maior o risco de fraudes no sistema financeiro e nos dados da própria economia. Essa pontuação também é menor quando o governo tem o costume de intervir nos mercados prejudicando os investidores, empresários e consumidores.
Caso você queira investigar quais são os melhores países com relação a todos esses indicadores visite aqui. Você vai descobrir que os BRICS estão querendo rivalizar com países que estão em situação muito melhor com relação a todos esses indicadores de liberdade.
Sobre as dezenas de outros países que estão interessados na moeda de ouro do BRICS é interessante observar o índice de liberdade econômica de cada um, com base no relatório da Heritage Foundation (2021):
– Argélia: 46,9 (liberdade reprimida)
– Argentina: 53,1 (liberdade majoritariamente não-livre)
– Bahrein: 66,3 (moderadamente livre)
– Bangladesh: 55,1 (majoritariamente não-livre)
– Belarus: 61,7 (moderadamente livre)
– Egito: 54,0 (majoritariamente não-livre)
– Indonésia: 64,4 (moderadamente livre)
– Irã: 49,2 (liberdade reprimida)
– Cazaquistão: 63,3 (moderadamente livre)
– México: 66,0 (moderadamente livre)
– Nicarágua: 57,2 (majoritariamente não-livre)
– Nigéria: 57,2 (majoritariamente não-livre)
– Paquistão: 54,8 (majoritariamente não-livre)
– Arábia Saudita: 62,4 (moderadamente livre)
– Senegal: 59,3 (majoritariamente não-livre)
– Sudão: 46,5 (liberdade reprimida)
– Síria: 43,5 (liberdade reprimida)
– Emirados Árabes Unidos: 76,9 (majoritariamente livre)
– Tailândia: 69,7 (moderadamente livre)
– Tunísia: 55,8 (majoritariamente não-livre)
– Turquia: 64,4 (moderadamente livre)
– Uruguai: 69,1 (moderadamente livre)
– Venezuela: 25,2 (liberdade reprimida)
– Zimbábue: 43,1 (liberdade reprimida)
O que podemos concluir é que, infelizmente, o Brasil está se esforçando para se tornar aliado de países em situação preocupante com relação a uma série de indicadores de liberdade.
Como já falei outras vezes, não existe educação financeira quando não existe liberdade, pois o objetivo da boa educação financeira é a de conquistar um elevado nível de liberdade e independência.
Pessoas não enriquecem sem liberdade. OS países ricos são feitos de pessoas que enriquecem por serem livres para isso.
A visão de mundo de muitos políticos que seguem determinadas ideologias que marcaram a história de todos esses países do BRICS (e seus países apoiadores), não tem qualquer relação com liberdade das pessoas e independência financeira. Sempre foi e continua sendo justamente o oposto disso.
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Ainda acho melhor confiar no Dolar do que no ouro dos cumpanhêro.
O problema (para os governos é claro) é que uma moeda genuinamente lastreada em ouro não permite grandes manipulações monetárias e eu acho muito difícil (para não dizer impossível) governantes se sujeitarem a isso.
Olá Bruno. É isso mesmo. E o problema é acreditar que a moeda será genuinamente lastreada (basta ver a ficha dos envolvidos) e ser ingênuo de imaginar que os que serão atingidos ficarão olhando sem fazer nada. Provavelmente estamos diante de uma possível futura guerra envolvendo moedas. E o Brasil estará do lado do que existe de pior.
Exatamente o que eu ia comentar, parece que estao se formando dois blocos opostos, estilo Guerra Fria.
O fato é que as moedas fiduciárias do mundo inteiro estão se deteriorando por conta da impressão descontrolada de dinheiro. É vergonhoso que o dólar no mercado negro na Argentina já virou quase que a moeda oficial do país. Só que não adianta todo mundo correr para o dólar se o dólar também não passa de um pedaço de papel que está sendo impresso a todo instante. Eu acredito que em algum momento no futuro, não sei se próximo ou distante, as criptomoedas descentralizadas e anti-inflacionárias assumirão o protagonismo que merecem e a sociedade enfim poderá fazer suas transações e construir suas riquezas sem ter que se submeter à tirania dos governos.
Olá Leandro. Já deram todos os sinais de que no futuro as criptomoedas serão criminalizadas e as pessoas serão perseguidas. Será um grande tormento.
Eu também acredito que as criptomoedas serão criminalizadas assim como o câmbio negro na Argentina também é. Mas se for prender todo mundo, vai faltar cadeia e pagadores de impostos.
As penas não precisam ser a prisão. Logo eles serão capazes de caçar seus bens rapidamente, tirar determinados direitos, limitar sua liberdade e de forma indireta convidar você a se retirar caso não concorde com o sistema.
Olá Leandro, ontem estava no twitter discutindo com outro pessoa sobre inflação e ele disse não existir inflação de demanda no Brasil, somente inflação de custos. Eu não concordei com ele e gostaria de saber a sua opinião.
Olá Felipe. Não perca seu tempo com esse cidadão. Com relação a economia, o que ele acredita está mais perto de uma religião do que de outra coisa. Religião não se discute.
Excelente explicação Leandro.
Um banco de países irresponsáveis fiscalmente, moralmente e que cerceiam as liberdades individuais virem com a grande ideia de uma moeda única lastreada em ouro. Desculpe a piada, mas me parece obra da atual presidente do banco dos Brics, nossa ex-“presidenta” que se achava economista… 🙁
Olá Marco. Parece uma grande piada. É o que não falta atualmente. O mundo está se tornando uma grande piada.
Vivemos em um país que não se pode confiar em políticos, nem nas políticas feitas por eles. Como iremos acreditar em pessoas que jogam, 24hs por dia, contra o povo? Políticos brasileiros não possuem domínios sobre seus mandatos, são submissos a partidos políticos (facções), que, na realidades, só olham para dentro dos seus domínios e vantagens, deixando o povo ao leu, e em “quarto” plano.
Margaret Thatcher
“O problema com o comunismo é que um dia o dinheiro dos outros acaba.”
“O socialismo dura até acabar o dinheiro dos outros.”
Os socialistas gritam ‘Poder ao Povo’ e erguem o punho cerrado enquanto o dizem. Todos nós sabemos que o que realmente querem dizer é ‘Poder sobre as pessoas, Poder ao Estado’.
Muito bom o texto. Parabéns!
Lastro em ouro de tolo?
A impressão que tenho é que os países estão em disputa para ver quem destrói primeiro sua própria moeda, considerando que todos os governos vivem da impressão (criação) sem fim de dinheiro. Depois de doses cavalares de emissões monetárias durante a pandemia, temos doses (cavalares) de juros para tentar conter a inflação de preços. Até onde o sistema aguenta? O Bitcoin parece ser uma porta de saída desse hospício econômico.
Caro Leandro, duas perguntas: 1-do mesmo jeito que os Estados podem imprimir dinheiro, eles podem “desimprimir” o dinheiro? Não estou dizendo que vão fazer, mas se existem mecanismos para tal. 2-Como levantado em alguns comentários – seja neste artigo ou em outros – a desobediência civil pode ser um caminho? Afinal, se 50%+1 das pessoas se recusarem a participar do “Sistema”, será que ele cai? O problema será conseguir esses números. Mas estamos trabalhando para tal. Obrigado e sucesso a ti!
Eles costumam fazer o dinheiro perder o seu poder de compra. É uma forma de destruir valor. As pessoas estão mergulhadas em seus vícios de comportamento. Elas amam o sistema e a relação de dependência. Tudo que estão propondo está sendo recebido com aplausos.
Parabéns por esta análise e outras tantas que vc tem publicado.
Seu trabalho é fora de série.
Obrigado Adffo