Vamos imaginar que seu amigo possui uma empresa e pediu dinheiro emprestado a você. Então, você solicitou que ele desse mais informações sobre a situação financeira atual da empresa dele.
Ele explicou que as dívidas acumuladas são maiores do que todos os ativos da empresa. Mesmo se ele vendesse tudo o que tem de valor e somasse ao dinheiro que possui e aquele que irá receber, só seria possível pagar 55% do que deve. Isso significa que 45% de sua dívida não pode ser paga com tudo o que a empresa dele tem hoje.
Diante desse cenário apresentado pelo seu amigo, você sabe que a empresa pode ter dificuldades para cumprir suas obrigações financeiras. Se a empresa não conseguir gerar fluxo de caixa suficiente (dinheiro entrando na empresa) para cobrir suas despesas e pagar suas dívidas no futuro, ela pode ser considerada insolvente.
Diante disso, você emprestaria dinheiro para seu amigo sabendo que ele não tem recursos para cobrir as dívidas que já tem com outros empréstimos, financiamentos e outras obrigações? Você emprestaria se soubesse que ele não está fazendo nenhum esforço para cortar despesas, desperdícios, roubos e ineficiências na empresa? Você emprestaria sabendo que os cargos da empresa são ocupados por pessoas desqualificadas? Você emprestaria sabendo que ele está comprometido com a ideia de gastar mais do que arrecada, sem preocupação com o aumento de sua dívida?
Se ainda assim, decidir emprestar dinheiro, a taxa de juros para compensar o risco seria alta ou baixa?
O maior devedor do Brasil é o próprio governo e isso não é de hoje. Quando ele não consegue tomar das pessoas e das empresas todo o dinheiro que ele gasta para se manter, ele pede dinheiro emprestado oferecendo juros em troca (títulos públicos que as pessoas investem). Quando você vota, está escolhendo as pessoas que vão tomar decisões sobre como gastar o dinheiro que tomam de você ou o dinheiro que pegam de você emprestado.
O gráfico abaixo foi divulgado recentemente pelo Tesouro Nacional e representa o balanço patrimonial do Brasil (fonte):
Como você pode ver, o passivo do país (dívidas e obrigações) é quase o dobro dos ativos que Brasil possui. O gráfico acima possui um erro de proporções, que não sei se foi proposital. O “passivo a descoberto” deveria ocupar quase a metade da área do gráfico do lado esquerdo (quase 45%), mas aparece menor do que deveria. Fiz uma correção:
A figura acima foi feita por mim. Seria um rascunho improvisado e rápido para mostrar algo mais próximo da realidade. O Brasil só tem pouco mais de 55% (R$ 6,6 trilhões) em ativos contra R$ 11,9 trilhões de dívidas e outras obrigações. Significa que faltam 5,2 trilhões para fechar esse buraco. O buraco será fechado com aumento da dívida ou aumento de impostos. Não parece existir comprometimento com redução das despesas.
O balanço patrimonial de um país é uma representação da situação financeira desse país em um determinado momento. Se você investe na bolsa e avalia a situação financeira das empresas antes de investir (como ensinei nesse livro aqui), entende a importância de avaliar os gráficos do balanço.
Basicamente ele é composto por ativos (bens e direitos) e passivos (dívidas e obrigações). A diferença entre ativos e passivos é o patrimônio líquido, que pode ser positivo (indicando que o país tem mais ativos do que obrigações e dívidas) ou negativo (indicando que o país tem mais obrigações e dívidas do que ativos). No caso do Brasil, o patrimônio líquido é negativo em R$ 5,2 trilhões, o que indica uma situação financeira ruim. Se o Brasil fosse uma empresa ou uma pessoa, sua situação financeira seria ruim e seria difícil conseguir alguém disposto a emprestar dinheiro. Os juros seriam elevados para compensar o risco.
Vamos analisar mais detalhadamente com base na situação do país.
Ativos (6,6 trilhões)
Os ativos são compostos por créditos a receber (2,4 trilhões), investimentos, imobilizados e intangíveis (2,3 trilhões) e caixa e equivalentes (1,9 trilhões). O crédito a receber pode incluir dinheiro que o país tem a receber dos outros, enquanto investimentos, imobilizados e intangíveis podem incluir propriedades, infraestruturas e outros ativos não monetários. O caixa e equivalentes representam o dinheiro disponível imediatamente para o país.
Passivos (11,9 trilhões)
Os passivos são compostos por empréstimos e financiamentos (8,1 trilhões) e outras obrigações e provisões (3,8 trilhões). Isso significa que o país tem uma grande quantidade de dívida, que pode incluir dívida interna (dinheiro que o país deve aos seus cidadãos ou empresas através da venda de títulos públicos) e dívida externa (dinheiro que o país deve a entidades estrangeiras).
Patrimônio Líquido (-5,2 trilhões)
O patrimônio líquido negativo indica que o país tem mais dívida do que ativos para quitar essa dívida. Isso deveria ser motivo de preocupação para os investidores e contribuintes. Quanto menor a educação financeira das pessoas, menores as preocupações. Por esse motivo, vivemos na mais completa tranquilidade.
Para os investidores, um patrimônio líquido negativo pode indicar que o país pode ter dificuldades para pagar seus empréstimos e financiamentos, o que pode afetar a rentabilidade dos investimentos. Quanto maior a percepção de risco, maior tende a ser a taxa de juro real (acima da inflação) que o investidor deve exigir para compensar o risco. Percepção de risco depende da capacidade de compreender esses riscos.
Para os contribuintes, um patrimônio líquido negativo pode indicar que o país pode precisar aumentar os impostos ou cortar gastos para equilibrar suas finanças. Quanto menos impostos as pessoas pagam, mais ignorantes elas são com relação a tudo que estamos falando aqui.
Segue um conteúdo que divulguei recentemente no Twitter. Clicando no círculo azul será possível reproduzir o vídeo.
"Em vez de [a dívida] explodir em um ano, vai explodir em cinco anos (…) enquanto não explode, eu [investidor] vou ganhar dinheiro (…) comprando títulos brasileiros". Professor José Márcio Antônio Guimarães de Camargo, da PUC-Rio, sobre marco fiscal de Haddad: pic.twitter.com/9nlvGzzgne
— Clube dos Poupadores (@CPoupadores) June 21, 2023
Sobre o estouro da dívida ou o estouro da inflação:
"Há de fato uma possibilidade da dívida pública não estourar (…) E essa possibilidade é: a dívida pública não estoura porque a inflação estourou. A inflação vem, corrói a dívida pública…"
Prof. Marcos José Mendes, Insper, sobre a política econômica do país. pic.twitter.com/JUAYlKeVmr
— Clube dos Poupadores (@CPoupadores) June 23, 2023
Outro gráfico divulgado pelo Tesouro mostra os déficits da previdência:
Como a previdência funciona como um esquema de pirâmide, são necessárias a existência de muitas pessoas pagando muito dinheiro para sustentarem aqueles que estão aposentados. O déficit mostra que não há arrecadação suficiente para pagar a todos que recebem dinheiro. O gráfico destaca a existência de déficits enormes tanto nos regimes Geral de Previdência Social (RGPS) e Próprio de Previdência dos Servidores (RPPS) quanto no Sistema de Proteção Social dos Militares das Forças Armadas (SPSMFA).
Em breve os políticos vão começar a falar sobre cobrança de mais impostos para cobrir os rombos de uma mentira insustentável no longo prazo, chamada previdência, que foi criada no passado não muito distante para beneficiar alguns no presente e sabotar muitos no futuro distante.
Para quem está pagando pela previdência pública, não alimente esperanças de que ela vá funcionar no futuro.
Busque conhecimento para conquistar sua independência financeira nas próximas décadas, como mostro em meu livro sobre Independência Financeira (é um livro apropriado para pessoas com menos de 40 ou 45 anos que ainda tenham, no mínimo, 20 anos de trabalho pela frente).
A tendência mundial é transformar a previdência em um serviço de assistência que paga valores miseráveis para pessoas em situação difícil. Se você é um aposentado, torça para que o estouro do sistema só ocorra no futuro muito distante e oriente as gerações futuras para que não fiquem dependendo das migalhas.
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Fiquei confuso;
Diante do cenário exposto, avaliando tudo oq foi colocado, seria em erro aplicar em Tesouro Direto?!
Oi Thalles, não é um erro. Como um professor disse no vídeo, as pessoas vão comprar títulos públicos enquanto a dívida não estourar. Se repetirem a política econômica daquele governo anterior que sofreu impeachment por “contabilidade criativa” (um nome fofo para fraude contábil), provavelmente vão forçar a queda dos juros sem preocupação com a inflação. Durante aquele governo vimos o que acontece quando os juros reais estão baixos e a dívida está crescendo aceleradamente. Nossa moeda perde valor e a inflação explode. Hoje estamos com juros reais elevados, pois a selic está alta e a inflação está caindo e isso dá um folego para nossa moeda e para a bolsa. Como o professor falou, o estouro antes ocorreria em 1 ano, talvez ocorra agora em 5 anos. É importante estudar o funcionamento do Tesouro Direto e renda fixa com profundidade.
É interessante esse “erro” na proporção do gráfico. Eu já presenciei tais erros no noticiário ou no sites pró X assunto: minimizam ao mostrar uma notícia ruim para os interesses próprios, ou maximizam a proporção na hora de divulgar fatos contra os adversários.
O pior é que o gráfico foi feito pelo próprio Tesouro Nacional. Eles deveriam informar corretamente.
Contar com previdência nunca contei, mas ainda penso: O que fazer quando a pirâmide quebrar? Não vamos ser nós, com nossos investimentos que iremos pagar essa conta? “Quem tem vai dar pra quem não tem”.
Outra coisa, seria legal, Leandro, se vc fizesse uma tabela de ativos, passivos e PL de diferentes países (pobres e ricos) do mundo.
Abraço.
Olá Adeles. Não custa nada atualmente ter conta aberta no exterior. É um procedimento simples, feito por aplicativo. Vale lembrar que esse tipo de coisa não quebra no fim de semana. É um processo bem lento, de forma que as pessoas possam ter sua situação piorada lentamente, sem que reclamem muito. Novas reformas vão ocorrer, novos impostos serão criados, tudo vai piorando lentamente para que todos possam se acostumar sem se rebelar. Cabe a quem tem educação financeira, ficar desperto.
Leandro, concordo que ter patrimônio no exterior ajuda a se proteger, e muito! Mas mesmo o patrimônio no exterior pode ser um dos alvos para cobrir rombos internos do Brasil, não? Essa possibilidade aventada recentemente sobre tributar ativos do exterior pode ser uma das formas de obter recursos para cobrir o déficit da previdência, não acha?
E o pior de tudo é que estão falando sobre taxação não apenas dos rendimentos, e sim sobre o patrimônio! Você tem esse receio, ou considera que os recursos no exterior estão protegidos?
O lado bom, até onde sei, é que essa tributação não seria automaticamente descontada, dependeria de o investidor ativamente fazer o pagamento. Ou seja, no caso de o investidor sair do Brasil, o governo brasileiro não teria como tributar.
Você está desenhando um cenário extremo. Situações extremas vão exigir reações extremas. Tudo tem seu tempo. Esse processo de degradação é lento. Ter pelo menos uma conta no exterior aberta e fazer pequenos investimentos para aprender/testar, é algo que não custa nada fazer. Se a ideia for tomar o patrimônio das pessoas no futuro, você vai ter que avaliar se compensa ser escravizado. Mas isso é algo distante. O processo é lento e depende da perpetuação indefinida dessas pessoas no poder.
Mais didático que isso, impossível!! Ps: Salvem-se quem puder!!
Obrigado, Ronaldo.
Olá Leandro.
Diz a lenda que se jogarmos um sapo numa panela; enche-la com água fria; e aos poucos formos aquecendo a panela com o sapo dentro, é natural que ele fique estático e não reaja.
Irá se adaptando, sem perceber que a água vai fervendo aos poucos…e vai morrer.
Já estou aposentada mas procuro ficar sempre bem informada.
Um abraço
É isso mesmo, Marilene.
Li atentamente o material e começo a relembrar as falas dos dirigentes do governo federal tal como utilizar a poupança (investimentos) para ajudar os mais pobres. Fica evidente o uso do termo “pobre ou baixa renda” como forma de justificar qualquer disparate econômico, mas sequer colocar em debate a redução dos gastos públicos e mesmo o tamanho do estado – federal, estadual e municipal. Vejo que o Banco Central (2024) terá uma linha diferente quanto aos juros e que refletirá na inflação e piora da renda das classes baixa e média.
É a justificativa que eles sempre usam, como consequência ocorre o aumento da pobreza e mais justificativas para continuar o “disparate econômico” que produzirá mais pessoas precisando de ajuda dos políticos.